Reflexões caótico-poéticas sobre o Rio de Janeiro 2

Registro de Ocorrência

Perdeu playboy. A bela paisagem sob a luz de maio é o canto da sereia. Seduz com voz aveludada o incauto transeunte que como o marinheiro em alto-mar, é cooptado para um passeio de delícias em águas profundas e quebradas misteriosas. Ali, perde a vida extasiado de amor e pânico.

Sem mais metáforas, o Rio de Janeiro é a sereia: uma linda cidade em conflito consigo mesma que oferta e admira seu povo com a beleza de seu canto, para dar o repentino bote em quem se aproxima demais de alguns dos seus sedutores, mas perigosos, tesouros.

Esta exposição concisa, realizada em nobre espaço da cidade, nos traz a faceta mais incômoda da mágica sereia. Registro de Ocorrência, termo emprestado da rotina das delegacias, apresenta 11 artistas jovens que exibem, à sua maneira, percepções de um cotidiano carioca conturbado e violento, difícil de aceitar.

A idéia da mostra surgiu de uma ocorrência policial de fato. A partir dela, Jaime Portas Vilaseca engendrou a exposição de tema áspero e surpreendentemente pouco discutido na arte brasileira atual: a truculência e confusão urbana em nosso País. Os artistas foram convidados para explorar a questão, e o fizeram com sarcasmo e ceticismo, acreditando talvez que a arte não sirva apenas para acalmar as retinas cansadas, devendo também estimular o debate. Assim, a poesia se colocou como alento e escapatória, e também como via cínica de protesto de uma geração já acostumada às grades grotescas, e às epidêmicas câmeras de vigilância que cerceiam nossos olhares.

Tocar num tema tão contundente e caro para o cidadão pode induzir a uma certa literalidade das obras. No entanto, apesar desse risco percebemos um conjunto cuja potência estética-crítica vai além da mera competência de cumprir uma demanda temática. Por que o assunto é quente e a chapa também, e em meio ao fogo cruzado, a escritura sagrada da arte pode ser a única tábua de salvação para algumas almas perdidas. Será? Acreditamos que sim.

Daniela Labra


Reflexões caótico-poéticas sobre o Rio de Janeiro 1

Por Fred Coelho

I – o quadro

O rio d‘janira engole. Esse pedaço encravado e improvável entre sal, areia e granito grita e canta aos quatro ventos sua impossibilidade. Sua velhacaria. Sua preguiça dadivosa. Sua genialidade gratuita. Seu desperdício de beleza. Sua fusão perfeita entre a surpresa diária da natureza e a certeza cotidiana do ódio entre classes. Uma energia sinistra, uma sarna hedonista que alimenta o esmeril e tritura o passante, uma máquina iluminada e enferrujada que afunda a cidade e nos liberta para o mundo.

Muitas vezes, porém, o carioca acredita piamente que não precisa do mundo. Basta o paredão impávido da Pedra da Gávea ou a mureta do Bar Urca e está tudo certo, e não há nada mais. Essa é a força criadora da cidade. Essa é a certeza venenosa que nos fartamos entre bravatas estéticas e silêncios sobre nossa afasia cultural. Essa crença atávica em nós mesmos, essa condescendência tropical e gordurosa com o precário → dentre os bares e as artes, dentre as aulas e as casas de festas, o precário como estilo, o arremedo como direito autoral, o projeto não como esforço inicial, mas sim como resultado e realização. Em um discurso radical e sem relativismos (pois sempre existem alternativas e caminhos divergentes), vivemos dia-a-dia a aceitação de estar ficando para trás, praticamos envergonhados e entredentes a louvação de província, valorizamos pouco o ESFORÇO SUPREMO que é preciso para ampliar as possibilidades de ações e ideias. Pois, no rio d’janira, somos reluzentes, somos a tradição cultural do país, somos personagens de novelas, somos assassinos em capas de jornais.

continua em http://objetosimobjetonao.blogspot.com/

Boicote à política cultural

Repassando…

+++++++++

Car@s,
Agora em março acontece a II Conferência Nacional de Cultura, onde participarão os delegados eleitos nas Conferências Estaduais. Segundo o regimento interno da Conferência Nacinal é obrigação dos estados custear o transporte de seus delegados. Infelizmente o ÚNICO estado que se negou a cumprir o regimento foi o estado de São Paulo. Segue abaixo uma carta de repúdio escrita pelos delegados.
Att.
Wendy Palo
Coordenadora Financeira Instituto Cultural Janela Aberta

Nós, delegados democraticamente eleitos como representantes legais do Estado de São Paulo para a II Conferência Nacional de Cultura, a ser realizada no período de 11 a 14 de março, em Brasília, vimos por meio desta manifestar o nosso mais veemente repúdio, que pode ser subdividido em desagravo e indignação, ao governo do estado de São Paulo, notadamente invocado nas pessoas de seu governador, sr. José Serra, e secretário estadual da Cultura, sr. João Sayad, pela atitude de boicotar a nossa participação neste importante evento que faz parte de um esforço coletivo e somatório de dotar o país de uma política pública democrática que possa fortalecer a Cultura nacional.

Ao agir assim, os srs. governador e secretário estadual da Cultura do Estado São Paulo descumprem um regulamento previamente acordado entre União e Estado, além de desprezarem o esforço de mais de 400 municípios paulistas que, acreditando na adesão estadual à II Conferência Nacional de Cultura, realizaram as suas conferências municipais e intermunicipais, dispendendo para isso recursos humanos e materiais e reunindo milhares de cidadãos, representantes da sociedade civil e de poderes públicos locais, para debaterem e formularem questões e propostas pertinentes à Cultura.

Uma vez vencidos estes processos, os mesmos municípios voltaram a esforçar-se para enviar seus respectivos delegados eleitos para a cidade de São Paulo, onde em 26 de novembro de 2009, no Memorial da América Latina, realizou-se a fase estadual da II Conferência Nacional de Cultura – evento que também contou com esforços pessoais, governamentais e, mais grave ainda: com uso de dinheiro público para a sua realização. Dinheiro público cujo gasto se tornou  irregular, uma vez que o motivo final de sua utilização veio a se tornar desnecessário, dada a decisão do goverso do Estado em desobrigar-se de sua responsabilidade  para com os delegados estaduais, ou seja, a de garantir a participação deles mediante  arcar com os custos de transporte para Brasília.

Nosso repúdio não deve ser somente em nome – em nome dos delegados estaduais, mas também e, sobretudo, em nome de todos os milhares de cidadãos que participaram das fases municipais e intermunicipais, acreditando serem verdadeiras as intenções do governo do Estado para com a realização da II Conferência Nacional de Cultura.

É preciso salientar que, a partir da postura inábil e totalmente desprovida de prática em conferências do governo do Estado, demonstrada na forma caótica com que realizou a fase estadual, nossos representantes do governo do estado já sinalizavam desconforto com essa maneira de se relacionar com a sociedade civil e, em parceria desta, definir estratégias e propostas visando a implementação de políticas públicas culturais.

Mas esse desconforto pode servir para um nosso não estranhamento com o boicote político de nosso governo estadual à II Conferência Nacional de Cultura, mas não deve justificar o desrespeito dos srs. José Serra e João Sayad a todos os municípios e cidadãos paulistas que crêem em uma nova relação entre Estado e sociedade civil e, para tanto, não economizam tempo nem ações para a construção deste novo tipo de diálogo mais saudável e imprescindivelmente necessário. Este boicote não vitimiza somente a nós, delegados estaduais que subscrevemos a esta carta, mas sim a todo o povo paulista que acredita na Cultura como direito básico do cidadão.

Nós, delegados da Conferência Estadual de Cultura, primeira diga-se de passagem,  subescrevemos esta carta e convidamos a todos artistas, gestores(as) públicos ou privados, produtores(as) culturais, fazedores (as) e/ou sabedores (as) culturais a endossá-la. Ela nos serve como moção de repúdio ao governo estadual paulista, pelo boicote à II Conferência Nacional de Cultura, tanto quanto como a reiteração de nossa crença inquebrantável  na Cultura, na Educação e na Cidadania.

Os srs. José Serra e João Sayad nos deram um “belo” exemplo de como não sermos cultos, educados ou cidadãos.

Sem mais, subscrevemos

DELEGADOS ESTADUAIS DEMOCRATICAMENTE ELEITOS PARA A II CONFERÊNCIA NACIONAL DE CULTURA E APOIADORES DA DEMOCRACIA.

Só me acorde depois que o carnaval passar…

Arte contemporânea e Carnaval nem sempre combinam. Enquanto uma requer muito pensamento, o outro é só ação e devaneio dionisíaco… Assim, entraremos em recesso até que a Banda passe, mas no final da semana estamos aí de novo, levantando das cinzas. E vamos prá festa por que brasileiro adora isso, né?!

Deixo a dica de música de carnaval sem Axé mas com levada quase. É meio breguinha, mas divertida:

MIXTAPE PIZZA SAMBA – MASHUPS DE CARNAVAL PARA AGEMDA
André Paste, Brutal Redneck, Faroff, João Brasil e Lucio K, todos na capinha do Sassá aka Brutal Redneck, comendo a pizza de pedacinhos de disco do Moreira

E se você está achando que essa foto é na bagaceira Carioca, se enganou… Exportamos know-how há muito tempo. Isso é em Notting Hill, Londres, no carnaval de 2008.

Happy Art : )

Ah, que fofo!

O Happy Art Collectors é um clube de colecionadores… felizes! Que beleza! Deve mesmo ser muito bom ter uma graninha extra para gastar com arte. Alguém duvida? Agora vejam abaixo o statement dos Colecionadores da Arte Feliz, e a tradução inacreditável para o português. Tim-tim!

You love
Contemporary Art ?
You are a collector or you would like to become
You wish to get the best advices
You want to meet the best artists and visit their places
You will appreciate to be VIP Art Collector when visiting
Galleries and International Contemporary Art Fairs
Be the first to select and choose Art works
HAPPY ART COLLECTORS open for you doors
of the Best of Contemporary Art.
You will know everything about Artists, Ateliers,
Galleries, Museums, Shows, Fairs and Special Places.

Get in our website,
And for travel VIP all over the world with us,
BECOME A MEMBER OF HAPPY ART COLLECTORS

Como Arte Contemporânea?
Você é um colecionador ou quer se tornar
Quer receber conselhos
Você quer conhecer os artistas em seus estúdios
Ser recebido na VIP Feira Internacional de Arte Contemporânea
Sendo uma prioridade para a seleção de obras
HAPPY ART COLLECTORS abre todas
As portas do mundo da arte contemporânea.
Artistas, oficinas, galerias, museus, exposições,
Feiras e Lugares inéditos mais segredos para você.

Entre em nosso site
VIP e viajar pelo mundo com a gente
SEJA UM MEMBRO DA COLECÇÃO HAPPY ART

http://www.happyartcollectors.net

Não é arte… É a intervenção do Demo!

Eu, Claudio Angelo, editor de Ciência da Folha, e Rafael Garcia, repórter do jornal, decidimos abrir uma igreja. Com o auxílio técnico do departamento Jurídico da Folha e do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo Gasparian Advogados, fizemo-lo. Precisamos apenas de R$ 418,42 em taxas e emolumentos e de cinco dias úteis (não consecutivos). É tudo muito simples. Não existem requisitos teológicos ou doutrinários para criar um culto religioso. Tampouco se exige número mínimo de fiéis.
Com o registro da Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio e seu CNPJ, pudemos abrir uma conta bancária na qual realizamos aplicações financeiras isentas de IR e IOF. Mas esses não são os únicos benefícios fiscais da empreitada. Nos termos do artigo 150 da Constituição, templos de qualquer culto são imunes a todos os impostos que incidam sobre o patrimônio, a renda ou os serviços relacionados com suas finalidades essenciais, as quais são definidas pelos próprios criadores. Ou seja, se levássemos a coisa adiante, poderíamos nos livrar de IPVA, IPTU, ISS, ITR e vários outros “Is” de bens colocados em nome da igreja.
Há também vantagens extratributárias. Os templos são livres para se organizarem como bem entenderem, o que inclui escolher seus sacerdotes. Uma vez ungidos, eles adquirem privilégios como a isenção do serviço militar obrigatório (já sagrei meus filhos Ian e David ministros religiosos) e direito a prisão especial.

VEJAM MAIS EM
http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u660688.shtml

Voces Cubanas: blogueiros cubanos unidos

A Cuba Libre do século XXI começa aqui:

VOCES CUBANAS es un espacio abierto a todos los cubanos residentes en la isla que quieran tener un blog en internet. Este sitio no recibe ningún tipo de financiamiento ni pertenece ni está relacionado con ninguna organización política, fraternidad, religión, firma comercial o tendencia.

Cada bloger será responsable de lo que se coloque en su bitácora, así como de los enlaces que determine. Sólo se rechazarán aquellas propuestas con un contenido evidentemente pornográfico, racista o que exhorte a la violencia.

La presencia de un blog en la plataforma Voces Cubanas, no excluye a su autor de tenerlo colocado en otros sitio.

http://vocescubanas.com/

5º Edital do Programa de Especialização em Patrimônio

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional está lançando o , para selecionar candidatos à turma 2010. Este Programa de bolsas destina-se aos profissionais recém-graduados em diversas áreas do conhecimento, para sua especialização no campo da preservação do patrimônio cultural durante um ano, renovável por igual período.

Os candidatos selecionados serão especializados por meio de sua integração nas unidades do Iphan, distribuídos conforme tabela do 5º Edital do PEP, disponível no Portal do Iphan: www.iphan.gov.br.

As inscrições estão abertas até o dia 4 de março de 2010 e as atividades do Programa terão início em 2 de agosto de 2010.

Entrevista: Vito Acconci – arte e política da performance à arquitetura

Para começar o ano!

Vito Acconci – arte e política da performance à arquitetura

Por Daniela Labra (publicado na Revista Dasartes, Nº7, 12/2009)

Em setembro de 2009, por ocasião da segunda edição do evento Performance Presente Futuro, no Oi Futuro, Rio de Janeiro, o artista e hoje arquiteto Vito Acconci deu uma palestra sobre sua trajetória profissional. Conhecido no meio da arte como um dos precursores da body art nos anos 1970, nos Estados Unidos, suas performances e videos da época constituem um referencial importantíssimo para as gerações subseqüentes que discutiram e ainda discutem questões relacionadas à crítica institucional, à arte como ferramenta ativista e sua aproximação com a vida.

Nesta conversa, realizada num bar carioca à beira-mar, Acconci mostra-se o mesmo homem crítico e lúcido – embora tenha trocado, nos anos 1990, a arte conceitual de veia política por projetos arquitetônicos arrojadamente lúdicos, frequentemente financiados por fundos de Estado ou grandes corporações. Entretanto, o seu discurso ainda se apóia na mesma crença que move seu trabalho desde o início: de que a arte deve tocar o outro e impedir a banalização da existência.

À seguir, o artista fala sobre alguns pontos de sua trajetória, incluindo o mal-estar que cercou a execução de uma versão não-autorizada do projeto idealizado para o evento paulista Arte/Cidade, em 2002.

Você participou do projeto Arte Cidade, em São Paulo, e houve discussões sobre sua proposta (uma construção translúcida, suspensa por uma marquise central, instalada sob o viaduto do Largo do Glicério, com acesso feito por 3 escadas, sendo uma delas a partir do alto do viaduto. A obra era destinada aos sem-teto e possuía instalações para higiene pessoal e lazer. Ao fim, a produção do evento executou, sem o consentimento do Studio Acconci, uma espécie de contêiner adaptado). O que ocorreu?
Na época da mostra, Nelson (Brissac Peixoto, curador do Arte Cidade) e eu passeamos pela cidade e vimos muitas pessoas morando embaixo de viadutos. Pensamos que nosso projeto poderia dar casas a estas pessoas, mas que elas também precisavam de entretenimento. Então desenhamos uma espécie de casa invertida, em que um lado do teto se estendia até o chão e servia de escada para que as pessoas subissem e entrassem neste prédio de cabeça para baixo, que não precisava de teto porque teria a autopista do viaduto como um. Propusemos diferentes usos para aquilo: poderia haver uma tela de televisão e os pisos diagonais poderia servir como arquibancadas de um anfiteatro, ou poderia haver um playground para crianças… Enquanto projetávamos, Nelson se perguntava se teriam dinheiro para construir este prédio, mas quisemos apresentar o projeto independentemente disto. Fiquei muito surpreso quando ele me enviou um jornal noticiando nosso projeto. A figura mostrada no jornal era uma espécie de caixa, que foi chamada de “studio para os sem-teto”. Escrevi ao Nelson imediatamente dizendo que aquele não era nosso projeto, que não era nada diferente de qualquer construção para programas habitacionais, e que toda a idéia da recreação tinha desaparecido, e ele me respondeu que era o único modo pelo qual poderíamos ter nossa obra realizada. Não me opunha que ele fizesse isto, mas não poderia chamar este projeto de “nossa obra” porque não era. Às vezes a imagem de um projeto é mais eficaz que um projeto real, porque funciona melhor como uma espécie de ensaio. Quando você está dentro de um projeto você está perto demais para conhecer sua teoria.  Nunca entendi porque Nelson insistiu em fazer aquilo.

Você via este projeto como algo para ser aplicado nas ruas ou apenas um projeto artístico, conceitual?
Nada do que fazemos agora é projeto artístico. Fazemos arquitetura, fazemos design,… Mas não queremos ser apenas “uso”; queremos uso e algo mais. Se a utilidade fosse o único objetivo, aceitaria o que Nelson fez, pois era um lugar útil. Mas queremos um lugar que as pessoas usem e onde ocorram mudanças de pensamentos. Para o Arte Cidade, precisávamos da ajuda de Nelson, porque não conhecemos São Paulo, nem esse bairro. Teríamos adorado conversar com alguns desabrigados, porque de outro modo, nós estaríamos vindo de fora e dizendo “vocês querem isso”; sem saber o que realmente querem. Nunca nos encontramos com os sem-teto porque nunca soubemos que o projeto iria acontecer.
Algo admirável neste projeto é que ele valoriza os sem-teto. Em geral, projetos para a população pobre dão a ela o pior: o pior material, o desenho mais básico.
Em primeiro lugar, sabíamos que as pessoas geralmente não querem entrar em locais públicos fechados porque; quem sabe o que pode acontecer ali? Então usamos lâminas de plásticos de modo que se pudesse ver o interior. Havia luz no interior, porque aquela vizinhança não era muito freqüentada a noite, então pensamos que a luz poderia trazer as pessoas para o seu redor, não teriam medo deste local. E isso pareceu realmente importante para nós.

Saberia precisar quando fez a transição da arte para a arquitetura?
Foi no início dos anos 1980, mas foi no final dos anos 1990 que comecei a trabalhar com arquitetos. Eu pensei que, se eu quisesse trabalhar com espaços públicos, não poderia fazê-lo sozinho. Não apenas porque eu não sabia como fazer arquitetura, mas também porque algo público deve ser resultado de uma discussão. Quando temos pessoas de diferentes nacionalidades e gêneros em conversa, todos têm uma idéia diferente de “público”, e unindo estas idéias podemos chegar a uma noção válida. Então, desde o final dos anos 80, todos os projetos vêm de um Studio de arquitetura.

E qual o motivo desta transição?
Eu apenas não sabia mais o que eu queria fazer em uma galeria ou em um museu. Assim como outras pessoas da minha geração, lá pelos anos 1970 vimos que os museus estavam mudando, mas não como pensávamos que deveriam, não em resposta a nossas perguntas: “por que os museus não têm janelas?”. “A arte é frágil? É tudo isso?”. Eu não sabia que significados as coisas poderiam ter além do básico: isto dá às pessoas um lugar para sentar, isto dá às pessoas um espaço mais fechado ou mais aberto. Comecei a me interessar por esta linha de pensamento, apesar de não buscar significados, pois acho que eles surgem quando as pessoas estão no meio de uma atividade. Acho que faz sentido que eu tenha vido de um histórico de performance, eu não quero que a arquitetura seja essa coisa imóvel, quieta… Espero que o trabalho de todo mundo venha de algum tipo de sistema de pensamento e que resulte do modo como eles vêem o mundo. É bom saber que não existe apenas um modo de se ver o mundo, se todos vissem o mundo ao meu modo, seria um mundo muito chato.  Por isto não posso dizer que, com meus projetos, esteja mostrando às pessoas como pensar, mas aqui está um exemplo.

Você sente que, a partir dos anos 1990, a arquitetura deixou de ser uma combinação entre o artístico e o prático e tornou-se algo apenas prático?
Bem, até pior que isso. Nos anos 80, acho que muitos arquitetos pensavam de modo artístico, em uma versão de “vamos fazer uma casa na qual a porta se pareça com uma boca e as janelas se pareçam com olhos; vamos fazer uma casa com o teto furado…”. É quase como se a Disneylândia tivesse chegado à arquitetura. . Então começamos uma arquitetura muito chata e formal. Tínhamos Bauhaus, algo que deveria ser muito funcional mas tinha uma preocupação estética; mas daí nos anos 1990, havia apenas o funcional e chato: você tem a Sexta Avenida em Nova York, onde há apenas essas caixas, seguidos de caixas e mais caixas,…Os projetos com influência da Bauhaus eram ótimos, mas uma vez que foram repetidos ao redor de todo o planeta, tornaram-se chatos. Não acho que estes criadores sejam preguiçosos, eles apenas pensaram “esse é um meio de construir mais barato do que construíamos antes”. As corporações têm seus próprios programas, que não consideram a convivencia social dos empregados ou  a noção de espaço público. Como os shopping centers, onde o espaço é para o público, mas não é público. Mas há pessoas pensando diferente. Recentemente, fomos procurados por um corretor de uma empresa que está comprando vários centros comerciais (strip malls) nos Estados Unidos e queria que os reformássemos. Estes aglomerados de lojas, geralmente nos subúrbios ou entre as cidades, são muito comuns nos Estados Unidos e são todos iguais, como caixas. Este investidor queria que 60% ou 70% desta estrutura fosse mantida e que, para os resto, propuséssemos algo surpreendente. Tinham interesse em fazer espaços modificáveis, para que a pessoa que alugasse uma loja pudesse aumentá-la ou reduzi-la, então sugerimos postes curváveis para fazer cada loja, um sistema muito maleável,  que pode inclusive ser usado no lado de fora, para se fazer um jardim coberto. Eles ficaram muito interessados, mas ainda não sei se isto vai acontecer.

É possível imaginar que a extrvagância atual de alguns artistas esteja relacionada ao mercado, que sempre busca o novo. Com sua arquitetura, você parece entender que o novo está dentro de si, de cada indivíduo, e que é necessário respeitar a própria forma de pensar fora do senso-comum. É assim que você pensa sua arquitetura?
Me questiono se a arte pode algum dia ser separada do sistema monetário. Os trabalhos da minha geração, por exemplo, só foram possíveis porque as galerias de Nova Iorque começaram a mudar de bairro, para o então afastado Soho, e em suas primeiras mostras não podiam pensar em ganhar dinheiro, mas em chamar a atenção. Não foi um mistério o motivo pelo qual a Sonnabend expôs Seedbed, as esculturas cantoras (singing sculptures) de Gilbert & George, a mostra de Dennis Oppenheim. Nenhuma delas gerou dinheiro, mas trouxeram as pessoas para dentro das galerias, e havia sempre uma sala dos fundos onde se vendia as obras que elas queriam. Não dar nada para as galerias venderem foi motivo de frustração para minha geração, mas o que não entendíamos era que fornecíamos algo decorativo, e as galerias precisam do decorativo tanto quanto precisam do atraente; ou até mais. Quando eu fiz Seedbed, a dona da galeria me ligou dizendo que tinha ouvido que eu faria algo muito notável em sua galeria e que fizesse o que eu quisesse. Quatro ou cinco anos depois, o Soho já havia se consolidado como uma região de galerias de arte e  os telefonemas eram muito diferentes: “precisamos ter alguma coisa pra vender”; “precisa ser documentado”. Ou seja, as coisa mudaram. Ela era com certeza a negociante mais interessante com qual eu já expus. Em uma entrevista, perguntaram a ela o que a fazia continuar, e sua resposta foi “curiosidade e ganância”. (Risos) O problema da maioria dos marchands agora é que estão focados mais na parte da ganância… Arte é um meio de ganhar dinheiro, e isso não é contra a arte. Em um momento ela serviu à religião, a maioria dos artistas que faziam pinturas religiosas não se importavam com a religião em suas pinturas; eles queriam as sombras e as luzes da arte. Mas deveria haver um equilíbrio.

Em sua trajetória você passou da escrita para a arte e da arte para a arquitetura, sempre encorajando a se alcançar o outro. No entanto, em sua palestra, você parece tentar alcançar o outro e ao mesmo tempo, começa a se esconder. Você está negando o artista em você?
Eu me escondo porque quando eu era uma pessoa conhecida por fazer performances, eu já não era mais apenas uma pessoa; eu estava me tornando uma estrela. Isto começou a me incomodar tanto que pensei em me disfarçar. No início dos anos 1970, eu lancei uma pequena revista – sempre falei da importância das pequenas revistas -insistindo que ela não teria nenhum critico de arte, apenas entrevistas com os artistas e textos deles, e todas as capas teriam o rosto de um artista. A idéia era mostrar que o artista é uma pessoa como qualquer outra, mas uma vez que a pessoa está na capa da revista, ela não o é mais, é como que tirada da multidão e tornada especial, um mito.

Você não pode fazer uma nova versão de Seedbed…
Não posso. Eu nunca fui capaz de repetir uma performance, porque pra mim a performance era uma prova de que eu conseguia fazer algo, portanto não faria sentido repetir algo que eu já sei que sou capaz de fazer. Minha noção de performance era quase como uma habilidade política, como executar um contrato, e isto era importante pra mim. “Eu não sei se realmente posso fazer isso, mas eu vou conversar comigo sobre isso”. E por isso muitas de minhas performances tinham eu conversando comigo mesmo: “eu quero ficar sozinho aqui no porão, eu não quero que ninguém desça ao porão comigo” (em Claim, 1971, o artista se postou na escada de acesso ao porão da galeria, segurando uma barra de ferro com os olhos vendados e reagindo à aproximação das pessoas). E é verdade que, da primeira vez que eu executei uma performance, na primeira hora, tudo o que eu queria fazer era fugir. Eu não queria que as pessoas me vissem me fazendo de bobo. Mas eu não pude. Tive que dar de ombros e achar um modo de ficar. À medida que prosseguiu, foi se tornando cada vez melhor, porque eu estava me hipnotizando. Mas aquilo foi quebrado de modo muito fácil também. Porque todas as performances têm histórias engraçadas. Inclusive, em Seedbed, eu tinha que urinar em uma garrafa. Eu também poderia ter matado alguém (em Claim); estava dizendo para as pessoas “eu vou te matar”, “eu vou te matar”, e em um dado momento eu estava balançando o corrimão, que estava frouxo, alguém disse: “Meu Deus ele está falando sério!”. Eu estava tão enfurecido que arranquei fora o corrimão; Perdi a cabeça. Esse projeto era sobre os americanos na guerra do Vietnã. Eu nasci em 1940, nasci e cresci em um tempo que os EUA deveriam ser essa nação heróica. Nós salvamos a Europa. Mais tarde percebi que os EUA eram um país criminoso.

Tradução: Geraldo Alves Teixeira Júnior

Mais Informações sobre o projeto original de Acconci para o Arte/Cidade :
http://www.pucsp.br/artecidade/novo/vito_st.htm
Sobre os projetos arquitetônicos do artista:
http://www.acconci.com