Ana Vitória Mussi no Paço Imperial, Rio de Janeiro

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O Paço Imperial apresenta até dia 7 de junho a exposição Imagética (1968-2015), retrospectiva da catarinense Ana Vitória Mussi, com curadoria de Marisa Flórido e Adolfo Montejo Navas. Radicada no Rio de Janeiro nos anos 1960, a artista trabalhou como repórter fotográfica entre 1979 e 1989, e desenvolveu uma obra pioneira no Brasil, dedicada à exploração dos limites da imagem e dos contextos midiáticos que a relacionam a distintas formas violência. Sua produção artística investiga a fotografia como um campo ampliado para além da noção de registro documental, em obras de crítica social relacionadas a um questionamento da função informativa – e do posicionamento político – dos mass media. Tal questão é clara nas pinturas “Jornais” (1970), onde interferia nas notícias e imagens estampadas nos periódicos, e criava narrativas dramáticas sobre o país na ditadura militar, em um mundo em guerra fria.

De acordo com a curadora, Ana Vitória foi também uma das primeiras artistas brasileiras a se apropriar sistematicamente de imagens de segunda geração, como se nota em “Duplos” (2012), trabalhos resultantes de fotografia de monitores de TV, cuja visualidade futurista, de seres que surgem de um infinito fundo negro, remete de certo modo a Gary Hill, importante videoartista norte-americano dos anos 1990.

Para alguns críticos, Ana Vitória é uma iconoclasta, cuja operação de manipular imagens do mundo e ressignificá-las misturando técnicas se mostra presente desde obras mais antigas como “Ossos” (1968) até a videoinstalação “Bang” (2012). O primeiro trabalho, que consiste em recortes de jornais desenhados, chama a atenção pela violência subjacente de imagens em preto e branco de multidões pontuadas por ossadas gigantes; já no segundo, a reflexão parece apenas ter se atualizado. Em “Bang”, quatro projeções simultâneas intercalam imagens de guerrilha nos morros cariocas e das ocupações das UPPs do Rio (emitidas ao vivo e fotografadas da televisão) com sete filmes e documentários da Segunda Guerra Mundial, enquanto ao fundo soa como doce trilha sonora a canção “Bang Bang (My baby shot me down)”, com Nancy Sinatra, do filme Kill Bill I (2003/2004), de Quentin Tarantino.

Na mostra predomina o preto e branco, característica que destaca o drama das imagens sôfregas de Ana Vitória, e também as envolve de mistério a respeito de sua própria natureza no mundo. O tempo denso que paira estanque na exposição é também um elemento notável e perturbador, que nos lembra que as mídias, fadadas a uma obsolescência programada, servem para registrar o presente no momento justo em que ele se torna passado. Além disso, a morte física do homem e a morte da imagem em uma cultura baseada na sua produção colossal e no “ver e ser visto”, é um tema que inescapavelmente cerca toda a exposição. Nesse sentido, se encaixa especialmente a obra “Por um fio” (1977/2004), formada por 22 mil negativos, costurados com fios de náilon, de eventos da alta sociedade fotografados entre 1977 e 1989, guardados pela artista durante os 10 anos em que atuou como fotógrafa de colunas sociais.

Além da mostra de Ana Vitória Mussi, outras três exposições individuais com perfis diferentes e recortes artísticos plurais completam a visita ao Paço Imperial: O português José Pedro Croft com suas elucubrações sobre espaço, arquitetura e seu duplo nos papéis e esculturas com vidro, espelho e ferro; O falecido Paulo Roberto Leal com sua pouco conhecida e interessante obra de inspiração Neoconcreta, desenvolvida entre os anos 1970-90; E o paulistano Alex Cerveny, cujos desdenhos, pinturas e objetos contam um mundo homoerótico fantástico e contemporaneamente lírico.

*Publicado em Jornal O Globo, Segundo Caderno, 25/05/2015

Jonathas de Andrade no MAR, Rio de Janeiro

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O Museu do Homem do Nordeste foi criado no Recife em 1979 a partir da junção dos acervos do Museu do Açúcar, do Museu de Antropologia e do Museu de Arte Popular de Permambuco. Sua concepção museológica inspira-se no conceito de museu regional do sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre, e seu acervo possui documentos das formas de arquitetura local e objetos que representam as manifestações socio-culturais populares do Nordeste, como a cerâmica, o carnaval e os cultos religiosos sincréticos.

Apropriando-se do nome e da proposta da instituição pernambucana, Jonathas de Andrade, alagoano radicado no Recife, ocupa o primeiro andar do MAR até 22 de março, com uma versão particular, atualizada e política do Museu do Homem do Nordeste. A exposição reúne 18 obras suas e 74 peças da coleção Fundação Joaquim Nabuco (dos acervos do Centro de Estudos da História Brasileira e do Museu do Homem do Nordeste), da Fundação Gilberto Freyre e do Instituto Lula Cardoso Ayres.

O resultado é um conjunto narrativo composto por instalações, vídeos, fotografias, pinturas, objetos e documentos que tensionam estereótipos e ideias pré-concebidas vinculadas à região. O Museu do Homem do Nordeste no MAR possui metodologia de investigação e catalogação de dados própria, que ganha corpo na sala do museu, sendo ela mesma uma proposta museográfica diferente, que informa uma ampla pesquisa sobre contradições e perversidades históricas brasileiras, discutida desde um ponto de vista nordestino, artístico e contemporâneo.

O Museu do Homem do Nordeste é composto por trabalhos com processos longos, tal como Levante, filme que dá visibilidade ao problema dos carroceiros na capital pernambucana: Trabalhadores socialmente invisíveis, que ganham a vida fazendo fretes em carroças de cavalos há décadas, e vêm sendo banidos das vias públicas de Recife pela especulação imobiliária e os veículos motorizados, ficando sem alternativa de sustento. Procurando dar voz à situação, o artista promoveu com os carroceiros a 1a Corrida de Carroças no Centro da Cidade do Recife, um protesto barulhento e celebratório, sob o pretexto de ser o roteiro de Levante. Tal estratégia permitiu a Andrade desenrolar toda a burocracia pública para as devidas autorizações da filmagem e, consequentemente, do protesto.

Enquanto o filme explora esteticamente a ambiguidade típica de obras artísticas que lidam com a realidade, a documentação da Corrida é exposta com notícias da imprensa, declarações e registros do cotidiano dos carroceiros, dando a dimensão desse mundo próximo do qual constrange falar. Quando Jonathas produzia Levante, entre 2012 e 2013, o país viveu as Jornadas de Junho e viu a violenta repressão do Estado. Assim, relatos de acontecimentos dessa época se somam à documentação da Corrida, formando um panorama tenso das recentes convulsões sociais brasileiras.

Os trabalhos da mostra usam táticas de ação distintas. Nos Cartazes do Museu do Homem do Nordeste, o artista publicou anúncios em classificados de um jornal popular do Recife, convocando homens trabalhadores com qualidades como: morenos, mãos fortes, boa índole, entre 30-50 anos, descendentes de escravos, feios ou bonitos, para posarem para arquivo fotográfico. Os interessados deveriam posar do modo como se imaginavam representando a região, e então formariam o catálogo de modelos másculos pouco ortodoxos dos cartazes do Museu. Além destas peças, a obra se completa com seis cadernos de anotações do artista sobre o processo de encontro e realização da foto com o trabalhador, revelando como são compreendidos e reproduzidos estereótipos de masculinidade e erotismo.

O Museu do Homem do Nordeste é um projeto fascinante na sua virulenta discussão cultural, apresentando de modo algo desconfortável crueza material, histórica, e sensualidade bruta. Suas questões atravessam a arte, a casa e a rua, conseguindo ocupar a instituição de forma inteligente e crítica, desconstruindo mitos de um Brasil pós-moderno que finge ignorar a herança escravocrata que ainda paira em 2015.

*Publicado em Jornal O Globo, Segundo Caderno, 6-01-2015

Artista como Bandeirante, de Maria Thereza Alves

Vídeo de Maria Thereza Alves, artista paulista residente na Europa, criado para a exposição “Feito por Brasileiros”:

“O vídeo, Artista como Bandeirante, é uma resposta ao ensaio de Alexandre Allard, Novos Bandeirantes, publicado no catálogo na ocasião da exposição Feito por Brasileiros no Hospital Matarazzo en São Paulo, em que participo com o trabalho, “Eu e os Matarazzos” ”.
Maria Thereza Alves

Arte x Gênero x Política x Moral religiosa

… Na arte, preceitos religiosos introjetados na sociedade como dogmas muitas vezes são questionados por artistas que acreditam que, em pleno século XXI é mais saudável defender a tolerância e as liberdades individuais do que submeter-se a regras morais impostas por religiões. Na atualidade a religião volta a incitar guerras, ódios, perseguição às minorias étnicas e repressão às mulheres – tal como na Idade Média. Artistas interessados em discutir questões de gênero são os que mais apontam para os problemas da ditadura moral das religiões, mas não só. A seguir, algumas imagens de obras que fazem refletir sobre o tema.

Leon Ferrari. La civilización occidental y cristiana, 1965.
Leon Ferrari. La civilización occidental y cristiana, 1965.
Leon Ferrari. La civilización occidental y cristiana, 1965.
Leon Ferrari. La civilización occidental y cristiana, 1965.

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Mary Beth Edelson. Last Supper. 1972

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Edwina Sandys. Christa, 1975

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Shirin Neshat. Rebellious Silence, 1994

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Marcia X. Desenhando com terços. Performance e Instalação, Anos 1990.

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Andres Serrano. Piss Christ, 1987

Orlan. Santa Orlan. Déc. de 1990.
Orlan. Santa Orlan. Déc. de 1990.
Orlan. Santa Orlan. Déc. de 1990.
Orlan. Santa Orlan. Déc. de 1990.

Fotografo, Logo Vivencio

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Ao chegar na exposição do escultor australiano Ron Mueck no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, o visitante se surpreende com a apurada técnica do artista e com a multidão acotovelada para ver e fotografar os seus prodígios hiper-realistas. No grande salão, pessoas que até há pouco não sabiam quem era Mueck e muito menos o que acontecia no Museu, empunham câmeras e celulares para captar, vorazes, imagens dos trabalhos e selfies atropelando quem tenta apenas apreciar as obras.

Se o enorme público estreante no MAM é um fato novo e positivo, pessoas fotografando a si ou a conhecidos diante de trabalhos de arte já não são novidade. Dentro ou fora do espaço expositivo é fácil comprovar que câmeras digitais e smartphones não só popularizaram o ato fotográfico como fazem-no parecer um gesto necessário para desfrutar a vida. No caso de exposições, onde encontra-se lazer associado a reflexão e conhecimento por meio do contato sensível, intelectual e até físico do espectador com a obra, tento imaginar o que os visitantes desejam capturar com suas lentes e como essa mediação digital transforma a experiência estética in loco. Entendo que a natureza de muitas mostras tem apelo publicitário e espetacular, estimulando a incontinência fotográfica, mas observo que o excesso de registros substitui o processo, hoje difícil, de postar-se atentamente diante de um objeto artístico para apreendê-lo na sua forma e conteúdo. Afinal, uma obra de arte não se esgota na visão rápida. (Continua…)

*texto publicado em O Globo, em 5/05/2014

 

This is not a Love Song – Mark Leckey ¨Fiorucci¨

Está em cartaz no Centro La Virreina em Barcelona, a exposição ¨This is not a Love Song¨, com curadoria de F. Javier Panera, cujo objetivo é traçar um paralelo entre a produção de video arte e a música Pop, desde os anos 1960 até hoje. A mostra oferece um caminho que começa com uma instalação de Andy Warhol com imagens de Velvet Underground, passando por obras seminais de video arte de Nam June Paik, Yayoi Kusama e Vito Acconci, entre outros, até chegar a artistas como AVAF, Mark Leckey e Cristian Marclay. O gran finale, no entanto, se dá com uma sala cheia de monitores exibindo videoclipes de artistas tão pop como Rihanna. O trajeto é muito rico, com poucos trabalhos que não sejam de fato interessantes, sejam como proposta estética ou registro histórico.

Um dos trabalhos que chama a atenção por ser ao mesmo tempo registro de época e experimentação de linguagem visual, é o video ¨Fiorucci Made me Hardcore¨ (1999), do inglês Mark Leckey. A obra faz uma referência clara à narrativa construída por Dan Graham em ¨Rock My Religion¨. Porém, enquanto este tenta contar uma espécie de história social do Rock and Roll em 50 minutos, o filme de Leckey tem apenas 14 minutos e narra de modo particular o desenrolar da cena underground de clubes em Londres, entre os anos 1970 e 90, cujo ápice foram as raves. O vídeo impulsionou a trajetória de Leckey até levá-lo ao Turner Prize, alguns anos depois, e aqui segue o link:

¨A Revoluçao não Será Televisionada¨ 10 anos

Em 2013 comemoramos 1 década da série de anti-programas de TV, ¨A Revoluçao não Será Televisionada¨, realizada com direção geral de Daniel Lima, junto com equipe formada por Fernando Coster (edição), André Montenegro (edição e produção) e Daniela Labra (pesquisa e redação). Aqui segue uma edição de 13 minutos do primeiro programa, que durava 26 minutos e foi transmitido pela UTV, em São Paulo. O título da série é uma referência ao poema homônimo de Gil Scott Heron, poeta, compositor e intérprete ativista negro norte-americano, atuante nos anos 1960-70.

Poetics & Politics, Screening @ LOOP Barcelona

O Festival de vídeo arte LOOP, tem edição em maio este ano, em Barcelona. Abaixo, uma das mostras dentro do evento, cujo tema são vídeos de teor ativista ou de discussão crítica do momento atual. Segue uma mostra do texto curatorial e o link para o festival:

Ante nuestros ojos – Poetics & Politics, Screening @ LOOP Barcelona

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Artistas: Marco Godoy, Pelayo Varela, Teresa Margolles, Eugenio Merino, Núria Güell, Gina Arizpe, Daniel G. Andújar, Antoni Muntadas, Rogelio López Cuenca, Santiago Morilla, Santiago Cirugeda, Fernando Sánchez Castillo, PSJM, Jorge García, Rubén Verdú, Carlos Garaicoa, Rafa Burillo, Tomás Ochoa, Patricio Palomeque, Rosa Jijón, María José Argenzio, Estefanía Peñafiel Loaiza y Avelino Sala

El espectro de representación política se agota. La creación de sujetos verdaderamente libres, de izquierda a derecha , es una quimera olvidada y consumida. El exceso de información y de servicios de comunicación ahonda la separación entre realidad y simulacro instaurando la sensación de una cacofonia existencial asfixiante. Nada de lo que se presenta está , ni de lejos , a la altura de la situación. Incluso en su silencio (por exceso de ruidos) la propia población parece infinitamente más adulta que todos los títeres que se pelean por gobernarla. La crisis de representatividad y la distancia entre la ciudadanía y el estado deja al descubierto la imposición de un modelo social represivo y muestra las verdaderas estructuras de un poder que se ejerce desde una verticalidad faraónica.

Alexis Callado Estefania (miembro del colectivo Commission)