Evento Gospel agora pode receber dinheiro público.

 Rothko Chapel, 1971.

Capela ecumênica projetada pelo artista moderno norte-americano Mark Rothko, encomendada pelos filantropistas John e Dominique de Menil. Localiza-se em Houston, Estados Unidos, e trata-se de uma iniciativa do investimento privado que conjuga arte e espiritualidade, sem apontar um dogma. http://www.rothkochapel.org

Aqui segue uma notícia  que reflete o que é este Brasil do progresso a todo custo: A presidente Dilma sancionou a alteração da Lei no 8.313, de 23 de dezembro de 1991 – Lei Rouanet – para reconhecer a música gospel e os eventos a ela relacionados como manifestação cultural.   http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12590.htm

Sendo este (ainda) um Estado laico, é inaceitável essa manobra populista. A Cultura já sofreu corte brutal orçamentário em 2011-12, e ter ainda que competir com eventos religiosos de toda ordem é um espanto. Enquanto igrejas pentecostais se disseminam no país velozmente, pregando alienação e mercantilismo em nome de Deus, a educação fundamental continua sendo de péssima qualidade – e isso, a meu ver, explica o sucesso e a pressão que a bancada religiosa faz no Governo, exigindo medidas como essa.

Em resumo: tal lei permite que eventos e produtos de conteúdo religioso sejam difundidos com dinheiro do Estado, ainda que na Constituição esteja escrito o seguinte:

“Artigo 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.”

E um detalhe: ao final do texto da lei, temos dois nomes assinando o documento: Jarbas Passarinho e o titular, ex-presidente cassado Fernando Collor de Mello – um exemplo de como nosso povo continua ignorando tudo o que se relaciona com a vida política.  Nem Jesus Salva…

9 thoughts on “Evento Gospel agora pode receber dinheiro público.”

  1. Esse é só mais um desvio bizarro.

    Por exemplo: Jorge Gerdau Johannpeter gosta muito de cavalos.

    Como Jorge gosta de cavalos, há anos a Gerdau vem “patrocinando” eventos de Hipismo. Os sediados no Rio de Janeiro são “patrocinados” com a Lei de Cultura do ICMS.
    Desconheço se na composição do “patrocínio” da Gerdau entram também impostos federais. Mas estaduais entram, e não há nada a obstar no processo, pois legalmente cavalos de corrida e de obstáculos são cultura…

  2. Pelo que parece a Sra. Presidente se sustenta no final do artigo 19, “…ressalvando, na forma da lei, colaboração de interesse público.” para sancionar a alteração que agora impele a cultura nacional ao julgo da barbárie. Em outras instâncias a mesma situação parece amparar tal situação. Pois o quê justifica o fato da Rede Globo ter subvencionado, no final do ano passado, o evento gospel na Praia do Flamengo?
    Em Búzios os artistas que participavam na 4a. Edição da bab Bienal(2011), foram conduzidos a delegacia por denuncia de evangélicos que, achando-se ofendidos com a performance do grupo Istmo, instigavam fiscais da Prefeitura(composta 99% de evangélicos) a intervir na performance dos artistas Bruno Mendonça e Felippe Moraes, dizendo: “Búzios é uma cidade evangélica”. Sinal do Fim dos Tempos?

  3. ‎…Mas quando é evento me cultura afro,ou parada gay com mosso dinheiro, ninguém reclama, né? só pra constar, “laico” não é o mesmo que “ateu” ou ‘sem religião”, pelo contrário.”A Laicidade do Estado não é portanto uma convicção entre outras, mas a condição primeira da coexistência entre todas as convicções no espaço público”.(http://www.laicidade.org/documentacao/textos-criticos-tematicos-e-de-reflexao/aspl/.) Só mesmo no Brasil religião não é cultura. A falta de caráter de alguns líderes não tem a ver com a questão.Sempre houve pedofilia na igreja católica e nem por isso deixaram de investir na arte. A arte precisa de apoio para florescer, a cultura evangélica ainda não se desenvolveu, ainda não tem uma identidade, mas ao invés de colocar na fogueira, que tal apoiar e incentivar os artistas (que diferentemente de muitos líderes evangélicos)que fazem um trabalho sério e estão tentando desenvolver uma cultura e identidade nacional?

  4. Aliás, Daniela Labra, curadora e crítica de arte, doutoranda em História e Crítica de Arte pelo PPGAV/EBA-UFRJ, já ouviu falar em arte sacra?

  5. Péssimo mesmo é uma pessoa como você, tão esclarecida, com doutorado e blá blá blá, dizer que religião não é uma forma de cultura. Graças a Deus (sem trocadilho :P) na época da Renascença não tinha alguém tão preconceituoso como você.

    Lastimadamente,
    André

  6. Bem, a discussão é complexa, mas com todo respeito Religião não é cultura, justamente. É religião. Se fosse cultura as Igrejas deveriam pagar imposto como a cultura paga. E agora com a Lei Rouanet os eventos que promovem as Igrejas poderão fazê-lo com dinheiro público. Sugiro não confundir “cultura geral”, que vai do funk carioca às artes abstratas e eletrônicas, com cultura religiosa. As religiões tem suas culturas – e crenças, podendo portanto exercer um dogma.
    E André, na Renascença as pessoas comiam, dormiam e viviam de modo diferente. O Brasil não existia como país e a luz era de lamparina… 😉

  7. Sim, Lya, eu conheço Arte Sacra. Mas isso é outra coisa, outros tempos. Temos vários argumentos frágeis defendendo a arte da Renascença nesta discussão que diz respeito ao uso de dinheiro publico no Brasil do Século XXI. O Estado não pode usar dinheiro público para disseminar cultos ou eventos religiosos, isso está na lei, mas agora poderá ter seu dinheiro investido em produtos culturais com conteúdo religioso. Então a Religião deve pagar impostos sobre seus produtos. Isso será um grande avanço. O que vemos é uma avalanche de Igrejas que surgem a cada dia nos rincões mais remotos do país, arrebanhando pessoas humildes e sem acesso aos direitos básicos que o estado deveria prover. O Brasil tem uma poderosa bancada evangélica bem conservadora e eu realmente temo pelo que vejo acontecer em cidades onde a educação é pífia e só a religião se instala, muitas vezes, esta sim, carregada de preconceitos e raiva contra os diferentes.

    País Laico é aquele que não coloca os interesses de uma religião ou outra em favorecimento de outras. Um abraço.

  8. Daniela, 1 – sobre a questão dos impostos, como você disse:”Então a Religião deve pagar impostos sobre seus produtos”, é verdade, deveriam, assim como as igrejas, terreiros, capelas, e templos de outras religiões não deveriam ser isentas.
    2 – “O que vemos é uma avalanche de Igrejas que surgem a cada dia nos rincões mais remotos do país, arrebanhando pessoas humildes e sem acesso aos direitos básicos que o estado deveria prover”. – bem,isso é oque o Sistema Constitucional chama de livre exercício da liberdade de crença – no caso, liberdade religiosa, não é? As igrejas não são apenas para ricos ou pobres.
    Também sou contra a mistura de religião&Estado, também sou contra eventos gospel-musicais(o crisitianismo não precisa de holofotes).
    3 – ‘País Laico é aquele que não coloca os interesses de uma religião ou outra em favorecimento de outras”. Bem, a cultura afro já estava contemplada pela Lei Rouanet, levando vantagem sobre todas as demais e não havia problema. Então o problema não é com as religiões, mas com eventos evangélicos? Por que não abrem logo a todas as religiões e cobram impostos de todas elas? Isso seria o correto.

    Nem todo evento evangélico tem a função de ‘arrebanhar gado’.
    Oque chateia é a discriminação implícita no seu discurso de igrejas arrebanhando pobres-coitadinhos. Há pastores corruptos , como há médicos, políticos, professores, cientistas corruptos, etc. A mídia gosta de enfatizar a corrupção na igreja porque é escândalo e vende bem. Mas nem todo pastor é (P)Edir Macêdo,ou Silas Malafaia(Malacheia). O trabalho social que as igrejas fazem não passa na mídia, como, por ecemplo, s trabalhos de reabilitação de viciados. Muitas pessoas estão vivas hoje porque foram “arrebanhadas” pela igreja, e por algum pastor que comprou briga com algum traficante pra proteger a pessoa.

    Mas enfim, o Art. 39. da LEI Nº 8.313 diz:”Constitui crime, punível com a reclusão de dois a seis meses e multa de vinte por cento do valor do projeto, qualquer discriminação de natureza política que atente contra a liberdade de expressão, de atividade intelectual e artística, de consciência ou crença, no andamento dos projetos a que se refere esta Lei.” – consciência de crença, não estipula qual crença. Na verdade, se foi preciso especificar uma religião, é porque ela estava sendo excluída,e não incluída, uma vez que o texto é aberto a religiões e a preferência a afro-brasileiros é evidente nos formulários da Rouanet. Cabe agora a “forte” bancada evangélica se posicionar corretamente, e não corruptamente.

    4 – “eu realmente temo pelo que vejo acontecer em cidades onde a educação é pífia e só a religião se instala, muitas vezes, esta sim, carregada de preconceitos e raiva contra os diferentes” – bom, oque você vê é a parte, e não o todo. Você está olhando a parte podre da laranja, e é inevitável um julgamento errado. A difusão da arte com temática religiosa é capaz de gerar um novo discurso para a religião, pois só assim poderemos sair do campo do sacro e partir para questionamentos até então impensáveis na igreja, por conta do “sagrado”.
    Não acredito nas boas intenções da bancada evangélica, como não acredito nas boas intenções de nenhum político, mas acredito que há gente séria fazendo arte, apenas expressando sua opinião e tentando sobreviver como artistas.

    Assim como Nando Reis pode se expressar cantando sua música “Mantra” em vários shows do projeto “Eu Faço Cultura“, que é produzido com recursos obtidos por intermédio Rouanet(sem questionamentos sobre parcerias com templos Hare Krishna), os cantores evangélicos (em sua maioria independentes de igrejas) podem expressar sua fé.
    E claro, você pode expressar a sua fé, sua não-fé, sua opinião,mas eu exerço meu direito de expressão porque estou cansada de cristianofobia disfarçada.

    No mais, (isto não é importante, mas)acho seu trabalho é fantástico, te acompanho faz tempo,e como fã do seu trabalho, coloquei minha opinião (nada fleumática)aqui.

    Acho que parar pra conversar seriamente sobre religião e suas possibilidades é mais útil do que jogar no lixo.
    Abraço

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