E o evento aconteceu. E foi um luxo. Performance Presente Futuro, no Oi Futuro, trouxe trabalhos incrÃveis, mostra de vÃdeos interessantes e 3 palestras que deram muito que pensar. Sim, eu fiz a curadoria e tenho uma visão parcial da coisa. Mas o retorno que tive do público foi esse: um evento com um recorte e produção excelentes.
O ponto alto foi a palestra da artista Orlan, no Brasil a convite nosso. Casa cheia, noite disputada.
Mas, se por um lado o público compareceu vibrante, por outro a mÃdia impressa, ainda cara aos divulgadores institucionais, parecia ignorar que mais uma vez algo interessante sobre arte contemporânea estaria acontecendo no fim de semana na cidade da televisão.
Se Orlan foi nosso destaque, para os meios de comunicação locais era só uma extravagância metida a arte. Elevada à condição de ‘corpo estranho’, Orlan ganhou pequeno destaque na revista dominical do principal jornal da cidade. Na coluna “Sei lá, mil coisas…” de 24/08/2008 o diário O Globo estampou uma foto da artista e três perguntas/respostas superficiais. Naquele espaço, que comenta lançamentos comerciais, chacotas e bizarrices da semana, Orlan surgiu ao lado do sósia de Roberto Carlos e de uma nota sobre implantes de cÃlios. Sei lá, mil coisas…
Na semana do evento lá estava Orlan de novo no mesmo jornal, não no caderno de cultura, cujo editor não dá muita bola para as bobagens da arte contemporânea, mas no guia de programação do fim de semana. Que bom. Mas também que triste: o evento, cujo foco era a performance ao vivo e suas relações com a tecnologia, saiu com o tÃtulo errado, ficando apenas “Presente Futuroâ€. E algumas apresentações, como as de Chelpa Ferro e MaurÃcio Ianês, foram divulgadas como ‘vÃdeos’. Foi como se tivessem suprimido a palavra ‘dança’ de um evento de dança.
O preconceito da mÃdia carioca impressa com a arte contemporânea faz corar público, profissionais e instituições por que se percebe como ignorância assumida e pensada daqueles que deveriam estimular o exercÃcio intelectual na sociedade. Após um ciclo de decadência, o Rio de Janeiro tem conseguido retomar uma agenda cultural ainda frágil mas já diversa e cosmopolita. Entretanto, o conservadorismo dos que editam o conteúdo dos veÃculos de comunicação impressos prefere a mesmice daquilo que é comercial.
Porém, talvez eles tenham suas razões: enquanto a fútil celebrity da vez implanta silicone bem-comportado sem alardear conceitos, ajudando a vender artigos, a artista Orlan, cuja manipulação corporal traz questões éticas, estéticas e filosóficas parece muito difÃcil, merecendo ficar mesmo no plano da bizarrice. Ainda que muitos digam por aà que ela é um dos nomes mais interessantes da arte do século XX.
Sei lá, mil coisas…
Caderno de cultura ????