(in)felizmente – exposição nacional de não-currÃculos
Recebi este spam e achei que pode interessar a alguns poucos… ou a muitos. CrÃtica institucional? Piada? Trabalho de artista a partir de outros trabalhos? Não sei, não sei.
Em 2002 a artista Graziela Kunsch mobilizou uma penca de artistas para se inscreverem no salão da Bahia com projetos absurdos. Segundo ela ” nossa proposta era que cada pessoa ou grupo inscrevesse um projeto de “correspondência”, intitulado “rejeitados”, acrescentando no projeto um parágrafo com o “critério de exclusão”. Este critério de exclusão dizia: “só me aceito se o outro for aceito. este projeto só poderá ser aceito se todos os trabalhos chamados rejeitados forem aceitos”. (rejeitados não vinha entre aspas, de modo que poderia significar os quase 1.700 rejeitados e não apenas os projetos que tinham esse nome)”. No fim das contas a comissão julgadora percebeu a crÃtica e aprovou todos os projetos do grupo que não conseguiu, assim, ficar de fora do evento (a artista gentilmente comentou e explicou com detalhes o que foram os rejeitados. veja nos comentários a este post.)
Voltando ao tema deste post, ele não tem nada a ver com iniciativa de Graziela e grupo, e me parece que o artista polivalente Tom Lisboa está levando a sério sua tentativa de construir um circuito paralelo com os que ainda têm menos visibilidade no circuito institucional ‘oficial’. Enfim, curioso e certamente, com jeito de jogada de marketing.
“CONVOCATÓRIA PARA A PRIMEIRA EDIÇÃO DE (IN)FELIZMENTE – exposição virtual de não-currÃculos
em curadorias, salões e outros eventos da área;
as seguintes informações:
Mais informações em www.sinTOMnizado.com.br/infelizmente
dentro e contra
ei dani !
te mandei o email mas depois vi que podia comentar aqui mesmo.
na verdade os nossos projetos não eram inexecutáveis, a não ser uma ou outra proposta (como os “projetos impossÃveis”, do jorge menna barreto/ dos laranjas).
a nossa proposta era que cada pessoa ou grupo inscrevesse um projeto de “correspondência”, intitulado “rejeitados”, acrescentando no projeto um parágrafo com o “critério de exclusão”. este critério de exclusão dizia: “só me aceito se o outro for aceito. este projeto só poderá ser aceito se todos os trabalhos chamados rejeitados forem aceitos”. (rejeitados não vinha entre aspas, de modo que poderia significar os quase 1.700 rejeitados e não apenas os projetos que tinham esse nome).
uma vez aceitos, começamos uma longa discussão sobre esta aceitação. e não concordo que “não conseguimos ficar de fora”. deixamos um espaço vazio no salão. justamente porque não cabÃamos ali. no catálogo, na página de fotos dos artistas presentes na exposição, os rejeitados são um quadradinho vazio. uma lembrança de que a cada seleção existem muitos excluÃdos.
envio abaixo um email do jorge que para mim resume o happening rejeitados. se um dia você tiver interesse, podemos conversar com calma sobre como eram os projetos de cada grupo (alguns exemplos: o alê, de goiânia, comprou um porco e começou a criar este porco. ele anotava seus gastos com a criação e mandava diariamente cartas com esses dados para o salão, solicitando o reembolso; mandava fotos do porco. o urucum fez cartas em um falso papel timbrado do MAM, dizendo que eles haviam sido selecionados no salão, colocavam essas cartas em envelopes do MAM, fechavam e “devolviam” para o museu, usando aquele carimbo do correio que diz “recusado”. eu estava morando em Paris e fiz um mapeamento dos nomes de TODOS os funcionários envolvidos no salão, desde o faxineiro até o diretor do museu e o governador da bahia (aproximadamente 68 nomes) e enviei cartões postais turÃsticos para cada uma dessas pessoas. alguns precisavam encontrar pessoas de outros setores para lerem o cartão inteiro, que à s vezes vinha em série, o que chamei de “happening da (des)igualdade social”. a carta ao júri era um cartão postal gigante da monalisa e meu texto se chamava “provocação à soberania do júri”. infelizmente esse texto se perdeu, mas o meu projeto era que os rejeitados fossem aceitos, eu colocava isso como uma coisa inevitável).
enfim, só para dizer que achei legal a referência, mas que a nossa ênfase não era fazer projetos impossÃveis para serem rejeitados; a nossa ênfase era o critério de exclusão, o “só me aceito se o outro for aceito”. além disso, o happening foi chamado por mim e pelo arthur leandro, em 2002 (nono salão da bahia), não em 2003 e os rejeitados viraram uma rede, um “coletivo de coletivos”.
aquele abraço,
grazi
De: Jorge Menna Barreto
Subject: uma mão decepada
Date: Thu, 31 Oct 2002 23:30:33 -0200
tem um artista que se chama andreas slominski que fez uma exposição assim:
ele abriu um buraco na parede da galeria, colocou ali a mão de um ser
humano decepada, e tapou com massa. de um jeito que não se sabia mais onde
estava a mão. pois o remendo foi perfeito. a crÃtica que escrevia sobre esse
trabalho perguntou-se se a sala estava vazia. e chegou a conclusão que não.
de que a sala estava preenchida. pela história. pelo rumor. pelo mistério de
se aquilo teria acontecido ou não já que não haviam provas. cheio de
provocação. convite pra pensar sobre confiança. sobre visibilidade. sobre fato e prova. sobre a galeria. sobre a mão decepada. sobre manualidade. e sobre a rejeição. a rejeição de ocupar o espaço conforme o esperado. e nessa desestabilização cria-se justamente o território fértil pra instaurar essas questões. espaço não-retiniano. o rejeitados está acontecendo. e se deixarmos uma sala vazia, ela já não estará mais vazia. ela já nos contém e já somos rumores. já somos história. já temos uma atitude. todos esses emails, todos os projetos produzidos por nós. toda essa reflexão não cabe no salão. não cabe. o ideal dos rejeitados também não cabe. rejeitados são sempre rejeitados pq não cabem nos critérios. podemos criar uma representação de tudo isso que estamos vivenciando e colocar a ponta do iceberg lá. mas a atitude rejeitados só se completará na ação de rejeitar. acredito. e penso que o que se quer aqui não é fazer um trabalho para apresentar no salão da bahia. mas promover uma discussão bem mais ampla sobre o sistema e os critérios dos salões, uma crÃtica mais profunda a todo o sistema de premiações que de nada apoiam a cultura brasileira. enfim, acho que uma não ocupação na bahia estaria repleta dessas convocações. somos muito mais do que esses grupos. somos, como disse alguém, mil seiscentos e tantos rejeitados somente nesse salão. e somos muito mais se formos contar socialmente. e não somos representáveis. na verdade, acho esse vazio preenchido de protesto como se fosse o tal gozo proposto por mariana. uma não afirmação desse salão. se participarmos como esperam, o salão se pretende “tão inclusivo a ponto de incluir a nossa
proposta”! quando na verdade é uma grande mentira. eles nunca nos incluiram, por que nem temos forma! e por isso que não chegamos a um acordo. os rejeitados são “formless” “informe” “aformais” incapturáveis. recusam-se a toda a formalização por sua própria condição. e não vai ser o salão da bahia que vai conseguir esse heróico ato de nos formatar! não temos rosto. somos a mosca na sopa, o dente do tubarão, o filho que ainda não veio, o inÃcio, o fim e o meio! risos! a não ser que a gente represente, e eles tb, e a quem estaremos enganando daÃ? a todos os rejeitados!!!! impossÃvel!
impossÃvel! a nossa não ocupação espacial é uma ocupação polÃtica. um ato
vazio de forma
e cheio de atitude polÃtica. polÃtica no sentido mais extenso de discussão,
diálogo, crÃtica, pensamento. que é isso que estamos fazendo aqui. isso é
polÃtica. pode ser que deixando esse espaço vazio, nada disso aconteça.
pode ser que seja uma grande bosta e que ninguém se sinta provocado a pensar
nessas questões. pode ser. pode ser ridÃculo. pode ser romantismo. eu quero
correr o risco.
eu não caibo nesse email.
jorge